sexta-feira, 20 de maio de 2011

CAPÍTULO 2

Estava preocupado. Não, aquilo não era preocupação. Era medo. Muito medo.
Jamais havia ministrado aulas em uma escola. O mais próximo que chegou a isso foi na época da faculdade, quando ajudava 3 ou 4 colegas no grupo de estudos.
Como reagiria quando aquela multidão de rostos ansiosos estivessem o encarando, esperando qualquer indício de nervosismo ou de falta de conhecimento?
Como se portaria quando algum, ou alguns...ou vários alunos lhe fizessem alguma piada ou lhe dirigissem alguma ofensa?
Não! Aquilo nunca daria certo! Iria perder o controle da situação! Arruinaria sua carreira! Sua tão sonhada e jovem carreira! Não estava pronto!

Kevin Walker olhava seu rosto pálido refletido no espelho do banheiro. Aqueles olhos negros como a noite o encaravam de volta. Um filete de sangue escorria da parte inferior de seu queixo onde segundos antes passara o barbeador barato e gasto. O cabelo castanho estava desgrenhado e formava um redemoinho como se representasse o turbilhão de pensamentos que o aflingia.
Os músculos bem definidos estavam tensos e suas mãos molhadas tremiam.

O alarme do rádio-relógio soou. Eram 8 horas da manhã. Ainda! Estava acordado desde às 6:30! Já havia levado Ben para passear, havia comido seu cereal fora da validade e murcho no café da manhã, havia passado horas (ou lhe pareceram isso pelo menos) debaixo do chuveiro e estava terminando de se barbear. Como ainda poderia ser 8 horas da manhã?!

Pressionou o papel higiênico em cima do corte e arrastou-se para o quarto.
* "This is the end.Beautiful friend.This is the end.My only friend, the end".

Realmente essa era uma música perfeita para começar um dia como o que estava começando! Kevin anotou mentalmente " Mudar de estação de rádio hoje à noite."

Vestiu a única calça social que localizou no guarda-roupa (não lembrava nem se tinha alguma outra), abotoou a blusa xadrez que ganhara de sua mãe no seu último aniversário e calçou seus mocassins. Deu uma única olhada no espelho na porta do guarda-roupa.
Realmente parecia um professor de matemática!
Aquela visão lhe deu algum ânimo.

Já estava quase na porta quando avistou em cima da mesa de canto um livro. Um livro volumoso com capa preta o qual nunca mais lera desde que saiu da casa de seus pais. Não era do seu feitio recorrer a bíblia, mas essa era uma situação emergencial.
Abriu o livro dos salmos.

Alguns poucos minutos depois chegou a uma conclusão. Era por isso que não lia mais esse tipo de coisa. Não tinha tempo e nem gostava de fazer interpretações. Odiava essa linguagem rebuscada e cheia de metáforas.

Respirou fundo, deixou a bíblia no sofá e saiu.

Ao fechar a porta pôde ouvir sons de papéis sendo rasgados enquanto Ben dava um último latido.



* The doors - The end

4 comentários:

  1. Volto para ler exte texto com mais calma. Parece bem interessante. pode me cobrar que volto msm, seguindo seu blog.

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  2. O visual do blog é lindo...


    http://cinemaparceirodaeducacao.blogspot.com/

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  3. Um texto com tanta qualidade as pessoas, pelos comentários acima, não leram. Uma pena... O ser humano desperdiça sempre grandes oportunidades de enriquecimento pessoal e entretenimento.

    Não sei se é intenção tua, mas eu já torço por um encontro entre os dois no conto. Parece que seriam duas solidões a se completarem para, enfim, deixar de ser solidão...

    Adorei! Esperando pela continuação. Me avisa, por favor!!! - rsrs

    Beijo.

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  4. Cooncordo com a Bárbara, as pessoas desperdiçam a oportunidade de ler algo de qualidade.
    Quanto ao texto, muito bom, novamente.
    O início me deixou meio apreensiva, pois sei que um dia estarei nessa mesma situação constrangedora de dar a primeira aula! Tenso.

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